Professores
Eduardo Kenedy e Ricardo Lima
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Introdução
O
objetivo fundamental da linguística como ciência cognitiva é:
observar, descrever e explicar a estrutura e o funcionamento da
linguagem no interior da mente humana.
Estudar
a arquitetura da linguagem é descobrir quais são as partes
constitutivas das línguas naturais, como essas partes interagem
entre si e de que forma elas se relacionam com os outros componentes
de nossa cognição. Ou seja, estudar a estrutura (competência =
anatomia) e o funcionamento (desempenho = fisiologia) da linguagem.
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Linguagem: Som e Significado
A
característica fundamental da linguagem humana é a sua capacidade
de fazer associação
sistemática entre um determinado som
e um dado
significado.
Para Aristóteles, a linguagem definia-se como
a arte de unir “som” e “significado”, bem
como a díade “som e
significado” seria a pedra fundamental da teoria do signo
linguístico, de Ferdinand de Saussure (1857-1913): “a linguagem
constitui-se
como um sistema de signos, no qual cada signo seria caracterizado
pela união indissociável entre um dado significante (som) e certo
significado.
Para
Chomsky, deve haver uma inversão no conceito. a principal função
linguística é carrear
signifiação – e o uso de sons para esse propósito é somente uma
das diversas formas de veiculação do significado, ou
seja, as
línguas naturais são um sistema
capaz de produzir
associações entre determinada forma
e certo conteúdo.
A
linguagem é um sistema organizado segundo princípios
e regras que geram expressões linguísticas de maneira ordenada e
previsível, que
dão-se através da associação entre uma dada forma e certo
conteúdo. A forma de uma expressão linguística é tipicamente uma
cadeia sonora, um “som”. Porém, devemos ter em conta que essa
forma pode ser também gestos visuais, como acontece com as línguas
de sinais usadas por pessoas surdas. Por seu turno, o conteúdo das
expressões linguísticas é sempre o seu valor informativo, o juízo
de verdade ou o “significado” do que dizemos.
Por
forma (som), devemos entender uma representação fonética,
que resumiremos com o
símbolo π (pronuncia-se
pi). Por conteúdo (significado), devemos entender uma representação
lógica,
sumarizada por λ
(pronuncia-se lambda). O par (π,
λ)
corresponde à díade som
e significado,
conforme ilustrado na figura a seguir.
Quando
analisamos uma palavra qualquer do português como, por exemplo,
casa, percebemos que ela possui uma substância fonética
[kaza] e um valor lógico [tipo de moradia], porém as expressões do
par (π, λ) não se limitam à expressão de itens lexicais
(palavras).
Elas
podem veicular também unidades inferiores
à palavra, como os morfemas, ou unidades superiores, como os
sintagmas e as frases. Assim, quando ouvimos um item como meninas,
reconhecemos nele três morfemas, isto é, três relações entre som
e significado que se estabelecem dentro da palavra: 1º [menin] =
[criança], 2º [a] = [gênero feminino] e 3º [s] = [número
plural]. Já quando lidamos com uma frase completa, atribuímos-lhe
um significado global, ou seja, fazemos uma representação λ
final. Tal significado é veiculado pelos sons que, em conjunto,
constituem a representação π
da frase. Por exemplo, em
Maria ama João,
π
corresponde, grosso
modo, à sequencia
fonética [maria ama joaum], ao mesmo tempo em que λ
veicula a interpretação
lógica evocada por esse π
específico, algo como [há um indivíduo X, tal que
X é Maria, e X ama um indivíduo Y, tal que Y é João].
Dizendo
de outra forma, devemos entender que a linguagem é um
sistema capaz de gerar o par (π,
λ), em que π
é uma forma fonética de qualquer extensão (desde o fonema até a
frase) associada a um dado que é um valor significativo de qualquer
grandeza (morfemas, palavras, sintagmas, frases). Essa é a
caracterização mais básica da arquitetura da linguagem humana.
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Os Sistemas de Interface
A
linguagem é um poderoso instrumento de
comunicação, mas não é a comunicação propriamente dita. Sendo
assim, muitos cientistas cognitivos concordam em dizer que a
nossa linguagem produz representações de som e signifi , mas são
outros sistemas cognitivos (como nossas intenções, crenças e
desejos, os aparelhos fonador e auditivo etc.) que motivam essas
representações e as põem em uso, inclusive para a comunicação.
Nele,
também encontramos dois polos, ambos interiores à mente humana. O
primeiro é o da produção das representações do par (π, λ), que
é de responsabilidade da linguagem. A linguagem funciona como uma
fábrica que deposita nas representações do par (π, λ) tudo o que
é necessário e suficiente para os diversos usos que delas podem ser
feitos, inclusive a comunicação. O segundo polo é o do acesso e
uso dessas representações, algo de responsabilidade de outros
sistemas cognitivos. Esses sistemas funcionam como usuários das
representações da linguagem, que as põem em uso para diversos
propósitos.
Os
sistemas cognitivos que acessam e fazem uso das representações do
par (,
)
são denominados SISTEMAS
DE INTERFACE, sistemas
de desempenho ou sistemas
superiores. Na arquitetura
da cognição humana, esses sistemas desempenham
a função de receber o produto (output)
da linguagem e transformá-lo em dado entrada (input)
para outros módulos da mente – os módulos de interface.
Os
sistemas de interface são, na verdade, um conjunto de faculdades
cognitivas. Elas encontram-se interligadas de tal maneira que se
torna possível agrupá-las, para fins descritivos didáticos, em
somente dois sistemas:
(1º)
o sistema de pensamento e
(2º)
o sistema sensório-motor.
Podemos,
também classificá-los em:
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Sistema de Pensamento ou Sistema Conceitual-Intencional
A
realidade do pensar não estruturado em palavras ou frases –
evidencia que o pensamento é um sistema externo à linguagem e dela
é relativamente independente. Mas é claro que, normalmente,
organizamos os nossos pensamentos através da linguagem. Usamos
palavras para representar conceitos e combinamos essas palavras em
frases complexas, fazendo com que conceitos complexos sejam
manipulados na estrutura das frases. A linguagem é, portanto, um
sistema que fornece ao pensamento expressões com as quais ele possa
se organizar. Isso significa que, na estrutura da mente humana, a
linguagem funciona como uma espécie de centro
de logística, o qual
provê o pensamento de instrumentos para a manipulação de
conceitos.
Dizendo
de outra maneira, a linguagem humana é um sistema capaz de produzir
representações
que atendam às
necessidades de outro sistema, um sistema externo – o sistema de
pensamento. Esse sistema de pensamento, também chamado
CONCEITUAL-INTENCIONAL
(diz
respeito ao
pensamento humano, isto é, refere-se a nossas crenças, desejos,
conceitos e intencionalidades,
a nosso raciocínio e a nossas motivações comunicativas.),
é, portanto, uma das interfaces da linguagem.
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Sistema Sensório-Motor ou Sistema Articulatório-Perceptual
Analisemos,
agora, as relações de interface entre linguagem
e sistema
sensório-motor.
Imagine que queiramos expressar nossos pensamentos às outras
pessoas. Com esse objetivo, apenas codificar ideias numa
representação
não
será o sufi ciente, afinal essa representação não é capaz de
propagar-se sozinha de uma mente para outra entre os humanos. Será
necessário, então, criar um meio de exteriorização que faça
chegar
à percepção dos outros indivíduos. Esse meio de exteriorização
será a representação .
é,
dessa maneira, a contraparte sonora do conteúdo de .
Na estrutura cognitiva humana, as informações contidas em
serão
acessadas pelo sistema sensório-motor. Tal sistema tem a função de
converter
nos
sons que conduzirão, pelo ar, as estruturas que veiculam ,
numa viagem que vai do aparelho articulador do falante até o sistema
perceptivo do ouvinte. O sistema sensório-motor, também
denominado ARTICULATÓRIO-PERCEPTUAL
(diz
respeito
ao conjunto das funções cognitivas responsáveis pelo controle da
produção e da recepção das unidades linguísticas, seja na
articulação e percepção de sons, seja na produção e na recepção
de sinais visuais),
é, por conseguinte, outra interface
do módulo da linguagem. Sua função, na mente humana, é claramente
exterior à linguagem: cabe a ele controlar o aparato físico humano
responsável pela produção e percepção de sons.
Por
exemplo:
recorreramos
à
frase simples Maria
ama João.
Depois de produzida, essa frase possuirá a forma ,
que é o conjunto de instruções que a linguagem passa ao sistema
articulatório-perceptual de tal modo que a cadeia fonética [maria
ama joaum] possa ser produzida pelo nosso aparelho fonador, propagada
pelo ar e percebida pelo sistema auditivo de nossos interlocutores. A
frase possuirá também o conteúdo ,
que contém a
informação
lógica [há um indivíduo X, tal que X é Maria, e X ama um
indivíduo Y, tal que Y é João], a qual será acessada pelo sistema
conceitual-intencional
e desencadeará o processo de interpretação semântica.
Os
estudiosos da linguagem devem sempre ter em conta que o sentido final
de uma expressão, isto é, o seu valor pragmático-discursivo, é o
resultado da interação de todos os módulos cognitivos ativados na
performance
linguística.
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Princípio da Interpretação Plena
A
linguagem é um sistema cognitivo
específico, que
não é independente dos
sistemas cognitivos que acessam e usam as informações produzidas
pela linguagem, também específicos
na mente humana: o sistema de pensamento e o sistema sensório-motor.
As
expressões que a linguagem
constrói só são úteis na medida em que possam ser usadas pelos
sistemas de interface. A única razão de ser da linguagem humana é
poder servir às suas interfaces. Sua missão exclusiva é construir
representações que possam ser manipuladas por nossos sistemas de
pensamento e sensório-motor, interfaces
que exercem bastante controle sobre a linguagem.
Os
produtos que a linguagem deve entregar às suas interfaces são, por
assim dizer, feitos sob encomenda, na justa medida. Tecnicamente, os
gerativistas afirmam que a linguagem produz as representações do
par (,
)
sob as imposições do Princípio
da Interpretação Plena
(em inglês, Full
Interpretation
–
às vezes chamado apenas de FI), que
deve
ser entendido como o conjunto
das restrições cognitivas que os sistemas de interfaces impõem ao
funcionamento da linguagem humana. Basicamente, ele determina que as
representações produzidas pela linguagem devem ser totalmente
interpretáveis em suas respectivas interfaces. Isto quer dizer que,
para satisfazer FI, a linguagem humana deve construir representações
de uma maneira tal que (1º) o sistema sensório-motor possa
reconhecer e pôr em uso todas as informações inscritas em
e
(2º) o sistema de pensamento possa acessar e usar todas as
informações presentes em .
O Princípio da Interpretação Plena estabelece, portanto, que uma
representação linguística qualquer deve sempre ser
concomitantemente legível nas interfaces fonética e lógica.
A
criação do par (,
)
sempre é regida por regras. Mas de onde advêm essas regras? A
resposta é: das interfaces! As regras que orientam a formação de
representações linguísticas são impostas pelos sistemas
conceitual-intencional e articulatório-perceptual. Seria como se, ao
entregar uma representação para as interfaces, a linguagem
recebesse dois vereditos, um do sistema de pensamento e outro do
sistema sensório motor. Ambos os vereditos têm de ser favoráveis,
isto é, os sistemas de interface devem sempre considerar as
representações de (,
)
“interpretáveis”, “legíveis”, “processáveis”.
Quando
o sistema de pensamento consegue acessar e usar as informações de
e,
ao mesmo tempo, o sistema sensório motor consegue acessar e usar as
informações de ,
dizemos que as representações do par (,
)
são interpretáveis nas interfaces, isto é, dizemos que as
representações são legíveis ou CONVERGENTES
(“bem
construídas” ou gramaticais”).
Se uma representação é convergente, então
ela foi gerada de acordo com o Princípio da Interpretação Plena.
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Os Componentes da Linguagem
Sabemos
que o par (,
)
são representações mentais construídas pela linguagem humana. As
representações linguísticas são criadas passo a passo, num
processo complexo que denominamos DERIVAÇÃO.
que é o processo computacional
por
meio do qual a linguagem humana constrói as representações que
serão enviadas para as interfaces. Ela começa com a seleção das
palavras que devem compor uma frase, passa pela combinação de
palavras em sintagmas e orações, e chega até as especificações
fonéticas e lógicas do par (,
).
Podemos
dizer que a linguagem humana é uma espécie de fábrica de
representações (,
).
Seus componentes são como setores dispostos ao longo de uma esteira
de montagem.
São
apenas quatro: Léxico, Sistema
Computacional, Forma Fonética (FF) e Forma Lógica (FL).
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Léxico
A
importância do Léxico no funcionamento da linguagem é crucial,
pois é nele que se encontram armazenadas todas as informações de
som e de significadoque devem ser combinadas durante uma derivação,
de modo a gerar representações complexas no par (,
).
O Léxico é, portanto, o início de
nossa linha de produção.
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Sintaxe ou Sistema Computacional
Seu
papel no funcionamento
da linguagem é combinar as informações retiradas do Léxico de
modo a gerar expressões de som e significado complexas, tais como
sintagmas e frases. Podemos dizer que o Sistema Computacional é
o componente central na arquitetura da linguagem humana. Retira
informações do Léxico para construir as representações
linguísticas que serão enviadas a FF e LF, e de lá seguirão para
as interfaces. É da Sintaxe que emerge o caráter produtivo das
línguas naturais. O
número de combinações que esse componente pode criar
recursivamente a partir das informações do Léxico é
potencialmente infinito. Em nossa linha de produção linguística, o
Sistema Computacional posiciona-se imediatamente após o Léxico.
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Forma Fonética (FF)
É
o componente responsável pela conversão sonora das expressões
geradas pela Sintaxe. De outra forma, componente
da linguagem que converte as representações advindas da Sintaxe em
informações articulatórias e acústicas a serem enviadas para a
interface sensório-motora.
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Forma Lógica (LF)
É
o componente responsável pelo tratamento das relações conceituais
das expressões construídas pelo Sistema Computacional. De
outra forma, componente da
linguagem que converte as representações advindas
da Sintaxe em informações lógicas a serem enviadas para a
interface conceitual-intencional.
“Fisiologia”
do Processo de Linguagem em
Derivação Simplificada:
1)
Digamos que os itens
{Maria, amar, João} sejam retirados do Léxico e enviados para o
Sistema Computacional,
2)
Uma vez introduzidos numa
derivação,
3)
esses itens sofrerão uma
série de operações computacionais até que a representação a
ser enviada para as interfaces seja gerada.
Por
exemplo:
1)
o Sistema Computacional
combinará os itens [amar + João] para gerar o predicado “amar
João”.
2)
Com esse predicado
construído, o Sistema o combinará com o sujeito “Maria”,
gerando a estrutura [[Maria] + [amar +João]].
3)Por
fi m, o Sistema fará a concordância entre o sujeito e verbo,
especificando o tempo, o modo e o aspecto da frase, de modo que a
representação sintática final estará pronta: [Maria ama João].
4)
Essa representação será,
então, enviada para FF, que elaborará a forma fonética [maria
ama joaum] a ser entregue à interface sensório-motora,
5)
e também para FL, que
construirá a forma lógica [há um indivíduo X, tal que X é
Maria, e X ama um indivíduo Y, tal que Y é João] a ser enviada
à interface conceitual-intencional.
|
Ou
seja:
-
Léxico
A
relação direta entre Léxico e FF/FL só acontece quando nos
comunicamos por meio de palavras isoladas, não concatenadas com
outras em estruturas
sintáticas elaboradas.
O
natural nas línguas é que as palavras apareçam articuladas entre
si em estruturas frasais complexas, algo que é levado a cabo pelo
Sistema Computacional da linguagem humana. Portanto, é raro que o
Léxico alimente diretamente FF e LF. Com efeito, o Léxico é
componente inicial de nosso fábrica de representações (,
).
Sua
função principal é prover a Sintaxe de itens lexicais com os quais
possa gerar sintagmas e frases a partir das operações
computacionais de uma derivação. São os produtos da Sintaxe, isto
é, os sintagmas e as frases, que devem ser enviados a FF e LF.
Na
arquitetura da linguagem, o Léxico deve ser interpretado como o
repositório de informações linguísticas que dão origem às
representações (,
).
Essas informações são tecnicamente chamadas de traços. Tais
traços são idiossincráticos e, por isso mesmo, podem variar
arbitrariamente de língua para língua, dando origem à diversidade
linguística existente no mundo. São três os tipos de traços
existentes no Léxico: semânticos,
fonológicos e formais.
Os
traços semânticos dizem respeito ao
conteúdo dos itens lexicais, seu
significado, enquanto os traços fonológicos referem-se à
substância sonora desses itens, sua pronúncia. Tipicamente, traços
semânticos e fonológicos são codifi cados e expressos no corpo de
um item lexical, como, por exemplo, o conteúdo [tipo de moradia] e a
pronúncia [kaza] presentes numa palavra como casa.
Os
traços formais, no entanto, são mais abstratos e não se realizam
visivelmente numa palavra isolada. Esses traços dizem respeito a
informações que serão acessadas pelo Sistema Computacional
e repercutirão na estruturação da frase.
O
Léxico não contém somente palavras.
Ele possui especificações de som e significado de morfemas em geral
(como “-s” do plural de nomes, “-mos” da primeira pessoa do
plural verbal etc.) e também de expressões idiomáticas (como
“chutar o balde”, “pagar mico” etc.) e frases feitas (como
“vale mais a pena um pássaro na mão do
que dois voando...” etc.).
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Sintaxe ou Sistema Computacional
A
linguagem só é comparável a uma fábrica qualquer no que diz
respeito à sua estrutura organizada em setores especializados ao
longo de uma linha de montagem – e é apenas nesse sentido que a
comparação é útil. Com efeito, os produtos de uma fábrica são
sempre os mesmos objetos inanimados, mas os produtos da linguagem são
infinitamente diversos e cheios de vida. Pense bem: o número de
representações num par (,
)
que podemos criar e interpretar é infinito.
Se
a linguagem conta com recursos finitos e limitados, como é que ela
consegue produzir representações infinitas
e ilimitadas? O
componente linguístico que dá à luz essa capacidade infinita
é o Sistema Computacional da linguagem humana. É justamente essa
capacidade combinatória da Sintaxe que faz emergir na linguagem a
infinitude discreta, sua propriedade fundamental.
A
Sintaxe humana é capaz de aplicar operações combinatórias sobre
itens lexicais de maneira recursiva, de tal modo que o resultado da
combinação entre esses itens são sempre representações
infinitamente novas, inéditas. Conforme já aprendemos nesta aula, o
conjunto dessas operações é o que conhecemos como derivação. Por
sua vez, o produto final
de uma derivação
é
o que chamamos representação.
Operações
da Sintaxe:
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Selecionar – (no inglês, SELECT) é a operação que retira um item lexical (como conjunto de traços) da Numeração e o introduz no espaço derivacional. Um espaço derivacional é o conjunto de itens que estão ativos durante a derivação e podem ser acessados pelas operações computacionais do Sistema. É a primeira e mais básica operação do Sistema Computacional. Retira do Léxico (na verdade, de um subgrupo do Léxico, chamado Numeração, que estudaremos nas próximas aulas) os itens que participarão da derivação. Uma vez selecionados para o espaço derivacional, esses itens lexicais se tornam acessíveis às outras operações do Sistema.
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Merge - É o termo inglês que significa “fusão”, “concatenação”, “combinação”. Tem como finalidade criar representações linguísticas complexas, afinal, como já sabemos, a linguagem humana raramente funciona por meio de palavras isoladas, preferindo sempre que possível expressões compostas. É a operação computacional criadora de objetos sintáticos complexos (como sintagmas, orações e frases), capaz de combinar dois objetos e deles gerar um objeto complexo.Por exemplo: os itens [amar] e [João] já tenham sido selecionados para espaço derivacional. O que MERGE deve fazer, então, é combinar esses dois constituintes, formando um terceiro: o predicado [amar + Maria].
MERGE
pode ser aplicado também sobre objetos complexos, já anteriormente
criados pela própria operação MERGE. Por exemplo, sabemos que
MERGE gerou, na frase de nossa ilustração, o predicado [amar +
Maria]. Agora MERGE é capaz de combinar esse objeto complexo com
outro item lexical, por meio da composição [João] + [amar +
Maria].
Poderíamos
seguir aplicando MERGE indefinidamente, de maneira a construir
objetos cada vez mais complexos, como as orações coordenadas e
subordinadas.
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Move - é uma forma especial de aplicação de MERGE. A especificidade de MOVE é que, nessa operação, um objeto complexo já formado no espaço derivacional é deslocado de uma posição para outra dentro da representação que está sendo construída. Muitas vezes, fazemos referência a MOVE com a expressão Regra de Movimento. Falamos em “movimento” porque a essência da operação MOVE é o deslocamento de um objeto entre diferentes posições sintáticas numa frase, tal como se ele tivesse sido movido. Trata-se de uma operação muito importante, responsável pela elaboração de vários tipos de representação sintática complexa, como voz passiva, oração relativa, topicalização etc.
Posição
original do objeto:
Você leu [que livro]?
Move,
deslocamento do objeto para posição sintática mais distante:
[Que livro] você leu?
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Spell-out - é a operação que retira a derivação em curso do Sistema Computacional e a envia para FF e FL. Essa operação funciona como uma espécie de supervisor, cuja função é identificar quando uma derivação já se encontra ao ponto de ser enviada para os sistemas que mais diretamente lidam com as interfaces. SPELL-OUT é, por assim dizer, o momento em que a derivação é dividida em duas partes, aquela referente a , que será remetida a FF, e a referente a , que seguirá para LF. Em FF e LF, a derivação de representações linguísticas segue em frente, até que esteja concluída e possa ser fi nalmente entregue aos sistemas de interface.
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Forma Fonética e Forma Lógica
São
os componentes finais
da arquitetura da linguagem humana. Sua característica fundamental é
fazer a intermediação entre as representações geradas pelo
Sistema Computacional e as interfaces articulatório-perceptual e
conceitual-intencional.
Mantém contato imediato com outros sistemas cognitivos humanos,
entregando-lhes diretamente as representações do par (,
).
Enquanto
FF é o componente dedicado à organização das informações sobre
som (ou sinais, nas línguas de surdos), LF
é o componente lógico da arquitetura da linguagem. Para Chomsky,
esses dois sistemas em contato com suas interfaces equivalem à
descrição moderna, no âmbito das ciências cognitivas, da díade
som
e significado,
presente nos estudos da
linguagem desde a antiguidade.
Se
FF e LF terminam o trabalho da fábrica da linguagem, o trabalho das
outras funções cognitivas humanas está apenas começando. É com
base nas representações do par (,
)
que nossas mentes criarão o
discurso, em suas infindáveis maneiras de manifestação
comunicativa.